25 de abril de 2008
BARBARA GANCIA
Ceder a caprichos é pedir para ver o filho crescer e se tornar um adulto com baixa tolerância para a frustração
EM UM MUNDO em que alterações de humor são identificadas num piscar de olhos como transtorno bipolar e tratadas a baldes de novas drogas cujos efeitos colaterais ainda não foram devidamente destrinchados, causa alguma estranheza a história do padre que saiu voando amarrado a balões de festa? Na visão dos terapeutas de porta de farmácia, o "noviço voador" do Paraná, com seu lero-lero messiânico, não seria imediatamente diagnosticado como alguém que está passando por episódio de mania?
Em um planeta em que qualquer criança um pouco mais ativa está passível de ser identificada e, pasme, medicada como portadora de DDA (distúrbio de déficit de atenção), chega a admirar o fato de que um pai imaturo e superprotegido pela família esteja agora sendo acusado de jogar a própria filha pela janela?
Tempos atrás, distúrbios mentais, hormonais (como a depressão pós-parto) e de aprendizado eram muitas vezes classificados como farinha do mesmo saco. E quem deles sofria corria o sério risco de passar a vida trancafiado num sanatório.
Hoje existem remédios específicos para tratar desde TOC (transtorno obsessivo-compulsivo, aquele do Roberto Carlos) até males que remontam à época do onça, como a dependência do álcool. Mas embora diagnósticos, terapias e novas drogas tenham evoluído e possibilitado que gente que antes era classificada "tout court" de esquizofrênica agora possa levar uma vida produtiva e, até certo ponto, independente, por outro lado houve uma regressão.
Eu pergunto: quantas vezes o dileto leitor já não ouviu algum pai ou mãe se vangloriar de conseguir dar ao filho tudo o que ele lhe pede? Não sei direito de onde nasceu essa aberração, mas conheço casos de gente humilde que se endividou até as tampas a fim de proporcionar aos filhos mimos imbecilizantes como tênis, brinquedos e videogames.
Outro dia mesmo, na TV, vi uma destituída choramingando por não poder dar ao filho o que ela chamou de "as coisas que ele me pede". Não sei quantos pimpolhos imploram aos pais que lhes dêem a possibilidade de fazer cursos profissionalizantes no Senai ou Senac, aulas de inglês ou de piano. Imagino que não sejam muitos. Mas sei de pouca coisa menos educativa do que dar à criança tudo o que ela pede. Afinal, crianças, como bem sabemos, são volúveis e novidadeiras e mudam de idéia a cada meia hora.
Satisfazer todo capricho da petizada é a antítese de educar com responsabilidade. É pedir para ver o filho crescer e se tornar um adulto com baixa tolerância à frustração, em suma, um irresponsável.
Adulto do tipo que pode vir a bater o pé e teimar em sair voando amarrado a balões de festa ou que, depois de cometer uma atrocidade com a própria filha, liga ao pai para vir acudir e esquece de chamar o resgate.
Em vez de correr ao médico atrás de um diagnóstico específico a cada vez que o filho é repreendido na escola (no caso dos mais abonados) ou de ceder aos caprichos da prole com presentes que podem custar uma bela porcentagem do salário (no caso dos mais pobres), não seria lindo se os pais voltassem a agir como pais e deixassem de lado essa moda besta de posar de amigão do peito ou de ser uma mera caixa 24 horas?
barbara@uol.com.br
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2504200806.htm
sexta-feira, 25 de abril de 2008
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