segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Miriam Leitão - Jornalista fala sobre a carreira

'Voz da experiência''
O bom jornalista nunca está completo', diz Miriam Leitão durante entrevista para a seção 'Voz da Experiência'

O Globo RIO - Ela circula entre presidentes, ministros, altos executivos. Viaja constantemente pelo país e para o exterior e não sai da ponte aérea Rio-Brasília. Visto assim, à distância, o cotidiano da jornalista Miriam Leitão parece ser puro glamour. Mas é feito de suor, estudo e disciplina. Eventualmente, o entrevistado pode ir além das perguntas.... - Ninguém perguntou isso, mas queria deixar aqui um recado para quem pretende seguir a profissão de jornalista: leia sempre, todos os dias. Leia notícia, romance, leia poesia. É fundamental - aconselha a craque, que assina a coluna "Panorama Econômico", diariamente, no GLOBO.

Um bom jornalista é completo quando tem que características? (Isaque Vieira de Moraes)MIRIAM LEITÃO: Isaque, um bom jornalista é completo justamente quando ele tem sempre em mente que nunca está completo. Um bom jornalista tem que estar constantemente em busca de novas informações, novos aprendizados, novas fronteiras. Ou seja, é buscar uma vida inteira e nunca estar completamente satisfeito.

Devemos escolher a carreira pelo prazer ou pela recompensa financeira? (Marcela Gonçalves Pavam)
MIRIAM: Se for possível conciliar, Marcela, ótimo. Se não, tem que ser pelo prazer, porque é isso que pode lhe dar a chance de ganhar um bom dinheiro, ao se dedicar ao seu ofício com afinco. Nos tempos de hoje, as profissões mudam bastante, e, além disso, as pessoas mudam de profissão ao longo da vida várias vezes. Ou seja, uma profissão que traz recompensa financeira hoje pode não trazer amanhã, e vice-versa. No meu caso, por exemplo, sempre fiz jornalismo, mas o jornalismo vem mudando com muita freqüência, assim tenho sempre a sensação de estar numa profissão nova. Minha escolha, feita pelo prazer, acabou sendo excelente.

O que fazer, caso você fique sem poder exercer sua profissão com plena liberdade? Temos visto tentativas em países como Venezuela, Nicarágua, Equador, Bolívia e até Brasil de cerceamento da liberdade da imprensa. (Marcelo Pereira Lopes)
MIRIAM: Entrei no jornalismo numa época em que não havia a menor liberdade e exerci por muito tempo meu trabalho sem conhecer o que era essa liberdade. Porém, em situações assim, a gente sempre encontra um jeito de dizer o que tem que ser dito e formas de resistir. Se limitações existem, o que não podemos é aceitá-las facilmente. É preciso resistir sempre.

Como é o dia-a-dia no trabalho de um jornalista? (Clarice Machado de Souza e Priscilla da Silva Daumas)
MIRIAM: O dia-a-dia do jornalista é sempre a falta de rotina. É uma surpresa constante, pois sua função vai da pauta, de onde você está ou mesmo de coisas menos palpáveis, como a sorte. Não há uma resposta única para esta pergunta. Se a pergunta é como é o meu dia-a-dia, não queiram saber. Só posso dar uma palavra: intenso.

De onde veio o gosto pela economia? Você tem alguma formação na área? (Rogerio Cipriani)
MIRIAM: Não sei muito bem de onde veio o meu gosto pela economia, acho que ele foi surgindo porque, por um longo período da minha vida profissional, o maior desafio do país era combater a inflação. A pauta econômica ficou muito mais interessante, e eu me sentia útil ajudando o país a entender as confusões econômicas. Mas hoje, embora eu permaneça na janela econômica, tenho incluído cada vez mais assuntos na minha pauta. Temas como as questões racial e ambiental, o combate à pobreza e à corrupção estão na minha lista de preocupações. Ah, sobre a formação, não tenho especificamente diploma de economia, mas estudei e estudo o assunto sem parar.

Por que a carreira de jornalista tem como pré-requisito o diploma de jornalismo? Na sua visão, até que ponto a faculdade de jornalismo é importante para um futuro sucesso profissional? (Marcelo Thompson e Ralph Guichard)
MIRIAM: Não acho que a carreira de jornalista deveria ter como pré-requisito o diploma de jornalismo. Aprendi muito pouco jornalismo na faculdade. De qualquer forma, acho necessário, sim, que se faça algum curso superior; existem vários cursos que nos ajudam a exercer a profissão. O que é preciso, sem dúvida, é ter disposição para estudar ao longo de toda a vida.

Gostaria de saber como você construiu sua habilidade em língua inglesa e a importância do conhecimento do idioma na sua profissão. (Helga Maria Saboia Bezerra)
MIRIAM: Helga, a importância de saber esse idioma é total e só tem aumentado com a internet. Não dá para fazer jornalismo sem conhecimento de inglês. Aprendi tarde. Na minha geração, isso não era uma preocupação como é hoje. Mantenho a habilidade lendo sempre, ouvindo sempre.

Quais são as suas dicas para quem faz, como eu, jornalismo e quer se especializar em economia? O que pode ser mais interessante: buscar um MBA ou fazer faculdade de economia depois de formada? Quais as possibilidades de mercado? Paga mais? (Precyla Vieira Eller)
MIRIAM: De fato o jornalista de economia continua sendo um profissional muito disputado. Dependendo de onde se trabalhe, é a editoria com maiores salários, em média. Fazer MBA, mestrado ou mesmo a graduação em economia é escolha de cada um. No entanto, faça o que o que fizer, não deixe de estudar constantemente, mesmo que seja sozinha. Tem que ler o que está acontecendo neste momento na economia. É preciso aproveitar o contato com cada economista para aumentar o conhecimento técnico. Mas uma dica: é sempre bom ter em mente que jornalista é jornalista, economista é economista, e o nosso papel é falar claro. Sobre outras áreas, acho que há oportunidades se abrindo e que terão mais demanda no futuro, como ciência e meio ambiente.

Quando você entrevista em particular uma pessoa importante, e ela responde em 'off', mas a resposta é um assunto que pode prejudicar milhares de pessoas, o que você faz? Fica com o segredo sabendo do dano que causará ou denuncia e quebra o "off"? Até onde o "off" pode ser respeitado? (Pedro Paulo de Lima-e-Silva)
MIRIAM: Se você se compromete a respeitar o off, tem de fazê-lo, mas é preciso saber o limite. Por exemplo, não se vai pedir informação ou aceitar um off de bandido. Não se pode fazer isso com uma informação que vá prejudicar as pessoas. Existem milhões de situações, é difícil falar hipoteticamente. Mas, no limite, seu compromisso é com o seu leitor; sempre.

Onde você estudou jornalismo? (Denilson Reis de Castro)
MIRIAM: Comecei no Espírito Santo e depois fui para Brasília. Mas acho que aprendi jornalismo, mesmo, nas redações, com os colegas. Tem uma coisa legal no jornalismo, que não se encontra sempre: um colega mais velho, preocupado, que se dispõe a ensinar. Esse lado cooperativo, embora nem sempre aconteça, é uma das coisas mais agradáveis da profissão. Nesse aspecto, tive muito sorte na minha vida; sempre houve muita gente com coisas a me ensinar. Assim, eu tento retribuir sempre isso aos mais jovens.

A profissão de repórter tem se tornado cada vez mais perigosa nos grandes centros urbanos. Você acha que esse tema deve ser debatido nas universidades? (Evandro Maia)
MIRIAM: Esse tema precisa realmente ser debatido nas universidades e nas redações. A minha geração enfrentou os riscos da ditadura. Agora, o risco é a violência. O problema é que, se o jornalismo não souber enfrentar esse desafio, ele pode se acovardar, e isso pode comprometer a qualidade do trabalho. O equilíbrio entre a segurança física do repórter e o dever de informar tem que ser avaliado caso a caso. Hoje já existem jornalistas se preparando para cobrir uma situação de conflito armado.

Com o avanço da internet, já há muitas pessoas que preferem saber dos acontecimentos do mundo em blogs. É possível que daqui a cinco ou dez anos jornais e revistas estejam obsoletos? Se sim, como fica o mercado de trabalho? (Caroline da Silva Soares)
MIRIAM:O jornalismo nunca vai ser obsoleto. As plataformas é que mudam. Uma coisa interessante é que se achava que a TV acabaria com o rádio; e ambos, com o jornal. Agora, falam que a internet vai acabar com o jornal, mas isso não está acontecendo. As mídias se somam e se reinventam. Quando trabalhei em rádio, há 30 anos, nunca imaginaria algo tão revolucionário como uma rádio só de notícia, como a CBN. Tudo isso vai continuar mudando. Os próximos anos serão desafiadores e interessantes.
http://oglobo.globo.com/educacao/mat/2008/04/07/_bom_jornalista_nunca_esta_completo_diz_miriam_leitao_durante_entrevista_para_secao_voz_da_experiencia_-426731822.asp

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