Posts retirados do Blog do André Forastieri, jornalista:
O estudo não compensa
Todos os experts concordam: o Brasil precisa é de educação. Há dez dias, um professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) afirmou que as diferenças educacionais explicam 40% das diferenças de renda entre os brasileiros. Para cada ano na escola a renda futura do estudante seria 16% maior.
Quer dizer que quem estuda mais ganha mais? Não. A FGV prova que quem estudou (no passado) ganha mais (hoje) do que quem não estudou. O resto é empulhação eleitoral e marketing de cursinho. Para o jovem brasileiro em 2002 o crime compensa muito mais que o estudo. Existem duas razões para isso. A primeira é que o Brasil tem se mostrado um país pouco inteligente. A média de estudo para a população acima de 15 anos é de 4,9 anos, na rabeira do planeta. A educação brasileira em todos os níveis é uma porcaria.
Quanto a nossas melhores escolas e universidades e seus formandos, atenção para o novo relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e seu Índice de Avanço Tecnológico. É uma síntese de oito indicadores diferentes que representam a capacidade de inovação de cada país, o que cada um tem a contribuir para a humanidade. Ganha o país mais inteligente. O Brasil instruído ficou em 43o.
A segunda razão é que não basta ter diploma, o diploma tem de render uma boa grana. Nações muito bem educadas já jogaram seus melhores cérebros na rua, da União Soviética à Argentina. Resta a eles engolir a frustração mal remunerada ou tentar debandar para países ricos. Aqui, igual. Piora cada vez mais a vida do brasileiro educado, viajado e bilíngüe. Boa parte está desempregada ou vegetando em frilas e subempregos. Está apelando também. Big Brother é exemplar: entre jovens brancos de classe média vale tudo por R$ 500 mil (até entrar para a indústria do sequestro, cujos mandantes são os criminosos com maior índice de escolaridade).
Com tudo isso, é espantoso que tantos brasileiros insistam em estudar. Principalmente os que têm de trabalhar também. O universitário favelado do Rio de Janeiro, por exemplo, tem renda equivalente à metade da média dos universitários da cidade (nem compare com os da Barra). É muito mais natural para os mais pobres se garantir no crime. Um estudo em 51 favelas cariocas deixa muito claro.
Acima dos 15 anos de idade, 20% dos favelados são analfabetos, mas o restante é quase: só 15% cursaram o ensino fundamental. Os salários dos meninos olheiros dos traficantes chegam a R$ 1.200 mensais. Compare com os bairros mais pobres de São Paulo, onde o salário médio do chefe de família é R$ 450. Já está achando que o crime compensa? Pois saiba que na periferia paulistana 41% dos homens entre 15 e 19 anos não freqüentam escola e um terço entre 18 e 24 anos está desempregado.
E as meninas? Vida dura também. Na periferia paulistana 12% das garotas entre 14 e 17 anos são mães. Nas favelas do Rio metade das meninas entre 15 e 17 anos não estuda nem trabalha. Opção financeira mais rentável? Tráfico. Ou descolar um gringo em Copacabana. Seguindo as regras clássicas da especulação financeira, no crime vale a regra de quanto maior o ganho maior o risco.
Na década de 70 o típico preso no Estado de São Paulo era casado, tinha 27 anos e alguma formação profissional. Hoje mais de um terço tem entre 18 e 25 anos e escolarização pífia. Entre o estudo e o crime existe sempre a possibilidade do extermínio. Segundo o Ministério da Saúde, de 1981 a 1989, 59 mil brasileiros entre 15 e 24 anos foram assassinados. Subiu para 112 mil entre 1991 e 1999. Hoje, nas capitais brasileiras, 43% das mortes entre jovens de 15 a 24 anos são assassinatos. Boa parte dos jovens morre pelas mãos de jovens. O restante fica para a própria polícia, que pouco diferencia o estudante do criminoso.
http://blogs.r7.com/andre-forastieri/2009/09/26/o-estudo-nao-compensa/
O brasileiro é burro
Eu nunca gostei de escola. Quer dizer, gostava dos amigos, de brincar, mas das aulas mesmo não. De nenhuma disciplina.
Mas minha birra com o sistema educional não é pessoal. É uma conclusão racional. Estudar não serve para nada.
Por duas razões. Primeiro, porque as escolas, em qualquer lugar do planeta, não ensinam muitas coisas importantes. O currículo brasileiro é especialmente deficiente.
Um amigo passou o ano de 1983 fazendo o segundo ano de high school no Canadá. Eles tinham aula de culinária, aprendiam a consertar motor do carro, encanamento.
Outro camarada, austríaco, aprendeu no colegial danças diversas – valsa, tango etc. Coisas práticas e úteis.
Uma boa escola deveria ensinar você a fazer molho de macarrão, planejamento financeiro e tudo sobre sexo. Você conhece alguma assim?
A segunda razão porque estudar não serve para nada é que as escolas brasileiras são uma porcaria, do maternal ao doutorado.
É o resultado de todas as pesquisas comparando escolas de diversos países.
E mais: é o resultado de todos os torneios mundiais, tipo “os mais inteligentes da França contra os dos EUA, Coréia, Brasil etc.”.
Não é só que a gente estuda pouco (seis anos é a média brasileira). É que mesmo o brasileiro privilegiado, quem estuda muitos anos em escolas muito boas, sabe muito menos que o equivalente de outros países.
Então, o brasileiro é burro. O que é um problema para o presente e mais ainda para o futuro.
Já escrevi sobre este assunto umas cem vezes. Um texto de anos atrás, para a revista Época, acabou até sendo tema de discussão em um teste do Enem – acho que os organizadores não perceberam a ironia da coisa.
Agora: de uns tempos para cá, esse assunto me perturba e me interessa cada vez mais. Porque eu tenho um filho.
Tomás vai fazer seis anos em dezembro e está na escolinha desde os seis meses. Então, eu tenho um interesse muito prático na educação brasileira. Não quero que meu filho cresça ignorante.
Ainda mais porque Tomás está em escola paga desde que nasceu. Burrice de graça já é problema, mas pagando?
A escola dele não está entre as mais caras de São Paulo, mas custa uma grana. Vale? Não tenho como comparar. Parece mais inteligente pagar do que arriscar com meu único filho.
Ele é um menino esperto e sabe de muitas coisas (olha o pai coruja). Mas não sabe ler, o que me dá nos nervos. Eu sabia na idade dele, porque minha mãe me ensinou.
Quando fiz sete anos ganhei a coleção do Monteiro Lobato, e já tinha traçado Caçadas de Pedrinho aos seis.
Em 2010 Tomás entra oficialmente no sistema educacional brasileiro, primeira série. Eu acharia muito bom que quando ele chegasse ao colegial e depois à faculdade, nosso país tivesse uma educação mais inteligente, mais justa e mais adequada ao século 21.
Adoraria acreditar que meu filho pode estudar no Brasil e ser educado decentemente. Tudo leva a crer que não, mas tirei este mês para fazer um esforço. Porque é outubro, que tem dia da criança e dia do professor.
Assim, este blog elegeu para as próximas semanas um tema, educação. Óbvio que vou tratar de outros assuntos.
Mas o tema educação virá à baila periodicamente. Juliana, Marcelo e eu estamos conversando sobre isso faz algum tempo. Nosso objetivo primordial aqui é:
a) descobrir o que está sendo feito de interessante e inovador na educação brasileira e gringa. O que é educação de ponta em 2010?
b) esculhambar cruelmente os aspectos mais absurdos da nossa educação.
Para isso, fomos levantando umas várias pautinhas e questões provocadoras.
Será que os brasileiros mais bem remunerados são os que mais estudaram?
Existe ligação entre escolaridade, cor da pele e renda?
Como é a educação dos deficientes? Funciona colocar uma criança cega ou com Síndrome de Down na mesma classe das outras?
Que faculdade está formando a elite que vai mandar no país em 2030?
E outros. Que aparecerão através da sua participação. Tem um tema que te interessa?
Tem alguém que você gostaria de ver entrevistado? Tem algo que te incomoda na sua escola? Manda que a gente corre atrás.
Vai ter temas sérios. E alguns nem tanto.
Por exemplo: um tempo atrás, a Xuxa deu piti porque criticaram o português de sua filha. Sasha escreveu “sena” quando queria escrever “cena”.
Xuxa explicou: “pra quem não sabe minha filha foi educada em inglês”.
Que que é esse negócio de ser educado em inglês? Você sabe?
Não é estudar inglês. É estudar o currículo todo – história, geografia, matemática etc. – em inglês. E em português também.
Algumas escolas, como o Pueri Domus, tem o currículo americano em um período e o brasileiro em outro. A molecada aprende quem foi o Tomas Jefferson, quais os afluentes do Mississipi etc.
Você acha esse sistema tão surreal quanto eu? Já odiava saber a história do Benjamin Constant e os afluentes do Rio São Francisco, imagina ter que decorar todo o currículo dos ianques.
E por que dos americanos e não dos ingleses?
Ou, já que é para atazanar a criançada, da China, que tem cinco mil anos de história e é o país do futuro?
Não sei se foi esse o esquema da Sasha e não é desculpa. Mas tenho certeza que Xuxa paga para a filha a melhor escola que seu muito dinheiro pode comprar. E a menina aos onze anos escreve “sena”.
Quer prova melhor que a educação nesse país é uma porcaria para os ricos também?
http://blogs.r7.com/andre-forastieri/2009/10/05/o-brasileiro-e-burro/
A ONU provou hoje que o brasileiro é burro. Mas quem lê este blog é inteligente
Eu disse que o brasileiro é burro. É uma média. Não quer dizer que todos os brasileiros são burros.
O povo que postou comentários no meu artigo, por exemplo, é bem inteligente. A maioria, claro. Sempre tem umas antas com argumentos tipo “burro é você, vai morar na gringa” etc.
Isso foi ontem.
Hoje foi divulgado que o Brasil ficou em 75º lugar, em um ranking global do IDH (índice de desenvolvimento humano).
Estamos quase na virada entre a primeira e a segunda metade dos 182 países avaliados pela ONU.
O coordenador do relatório desenvolvido pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Flávio Comim, explica como a décima maior economia do mundo está em 75º quando se trata da qualidade de vida de sua população.
Nossos principais problemas: saúde e educação. Que são interligados, claro. Temos uma altíssima taxa de mortalidade infantil.
Especialmente entre crianças filhas de mães sem nenhum acesso à educação – neste caso, as taxas de mortalidade infantil chegam a 119 por mil nascidos vivos.
“É um número maior do que os de muitos países africanos”, diz Flávio.
Filho de mulher burra morre mais – dava uma boa manchete do saudosoNotícias Populares.
Essa é uma das grandes explicações para morrermos tão cedo. A expectativa de vida é de 72 anos em média, dez anos menos que a japonesa.
E nossa educação? Somos o país 71 do ranking de 182. Está convencido de que somos burros?
Eu estou e não tenho problema nenhum de reconhecer minha burrice. O tamanho da minha ignorância só é sobrepujado pela minha preguiça de minimizá-la. Tenho lá meus espasmos autodidatas.
Mas na prática me eduquei sobre alguns temas – um pouco de história e geografia, um pouco de economia, um teco de culinária, o arroz com feijão de história da arte, o beabá da tecnologia.
E me escondi medrosamente de outros – ciência mesmo, física, química, biologia, botânica. Fiz como todo mundo, o que me foi mais fácil.
Por isso que um ano atrás, quando Tomás foi mudar de escola, decidi que a perfeita para ele seria uma que fosse muito boa de ciências e de esportes. Porque o resto eu estimulo ele a gostar… mas não achei a que eu queria.
Como você vê, além de burro, sou preguiçoso.
E a prova definitiva é que depois de um ano de pré-primário na Cigarrinha, sete anos na EEPG Barão do Rio Branco, mais quatro no Colégio Luiz de Queiroz (pago), sempre na gloriosa Piracicaba, e de conseguir entrar na USP duas vezes (jornalismo e história), sou o famoso “curso superior incompleto”.
Jornalismo, que fiz algum esforço para completar, abandonei porque era inútil e, principalmente, chato.
História fui um dia e nunca mais voltei. Devo ser um raro caso de duplo jubilamento na USP, mas nunca me mandaram nenhuma cartinha…
Dos 75 comentários até agora, alguns simplesmente concordam ou discordam do meu texto. Que é uma provocação assumida; por que tem gente que fica se abespinhando à toa?
Os comentários mais úteis para a nossa missão impossível – encontrar algo que preste na educação nacional – são os que vão além das palmas e das pedras.
Os que sugerem algum curso de ação ou dão um depoimento iluminador.
Como o Joaquim, professor de matemática que abandonou a profissão porque não quer ensinar para quem não quer aprender.
Ou o Miguel, que acerta um alvo importante ao criticar pais que querem fazer um filho “supervencedor”.
O pobre Washington, estudando 1ª Guerra Mundial no terceiro colegial.
O Mário Meletti, que lembrou uma ideia de lei genial do Cristovam Buarque, que obrigaria políticos a matricularem seus filhos em escolas públicas.
A professora Vera Menezes, tentando enfrentar a sedução que traquitanas tecnológicas exercem sobre a molecada.
Viviane sugere entrevistar o povo da UNE – sorry, querida, vou pular essa.
Ana Luisa mata a charada: as escolas brasileiras são chatas pra burro, e por isso são feitas pra burro.
Meu favorito, naturalmente, é o (a?) Luxorum, que me chama de “meu grisalho charmoso favorito”. Tobrigado!
Também tem o pedagogo Igor, dizendo que “burrice não existe”. Existe sim, Igor, porque sua afirmação para mim é incompreensível.
Tem o Diogo, que disse que sou idêntico ao Diogo Mainardi. Que isso, ele escreve muito melhor e eu sou bem mais velho (na verdade só pareço, o que é pior).
Mas qualquer fã de Ivan Lessa e Paulo Francis sai ganhando ponto comigo.
E tem um ou outro cobrando “então, qual é a sua proposta?”
Eu detesto quando me cobram proposta.
Não sou candidato a nada. Não tenho que ter proposta porcaria nenhuma. Jornalista a favor é assessor de imprensa.
Mas vá lá, esse é o mês de fazer uma força para acreditar que meu filho pode ter uma educação decente neste país.
Então, vou tentar ser positivo. Vamos atrás das sugestões e dicas.
Agradeço.
A gente podia entrevistar o Cristovam Buarque. Ideia excelente, será que ele topa falar comigo?
Ótima dica do Bruno Ribeiro, conversar com a diretora Ana Elisa Siqueira.
E o Anderson encomenda uma maneira de educar filho sem pagar escola. Boa pauta. Também, o cara sabe como eu penso, é meu leitor desde a Bizz – pô, essa relação já dura mais que muitos casamentos, heim?
E ótima dica é ler Neil Gaiman, que realmente é o autor da citação que Ramon observou:
“I’ve been making a list of the things they don’t teach you at school.
They don’t teach you how to love somebody.
They don’t teach you how to be famous.
They don’t teach you how to be rich or how to be poor.
They don’t teach you how to walk away from someone you don’t love any longer.
They don’t teach you how to know what’s going on in someone else’s mind.
They don’t teach you what to say to someone who’s dying.
They don’t teach you anything worth knowing.”
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